Mas por que Paulo fez essa afirmação de que os cristãos falecidos se encontrarão primeiro com o Senhor Jesus? Ao conhecer a visitação formal das autoridades, como a do imperador, por exemplo, a resposta parece clara. Chegando pela estrada principal a uma cidade, a autoridade imperial visitava os túmulos situados na entrada da cidade, para prestar homenagem aos mortos. Ou seja, os mortos eram visitados antes dos vivos. Com essa metáfora da visitação imperial, Paulo afirmou que, “então, os mortos em Cristo ressuscitarão primeiro”.
Nas cartas paulinas, Paulo usa a expressão “reino de Deus” em sete passagens: 1Ts 2,10-12; Gl 5,21; 1Cor 4,20; 6,9-10; 15,24; 15,50; Rm 14,17. Certamente, Paulo entende que o reino de Deus vai ser realizado no futuro, mas, ao mesmo tempo, afirma que o reino de Deus já está presente no meio das pessoas comprometidas com Jesus crucificado e ressuscitado.
“Nós exortamos e encorajamos vocês, e testemunhamos para que levassem vida digna de Deus, que os chama para seu Reino e glória” (1Ts 2,12).
- a) “Porque o Reino de Deus não consiste em palavras, mas em ação” (1Cor 4,20).
- b) “Pois o Reino de Deus não é comida nem bebida, e sim justiça, paz e alegria no Espírito Santo. Quem serve a Cristo nessas coisas, agrada a Deus e tem a estima das pessoas. Busquemos, assim, as coisas que trazem a paz e a edificação mútua” (Rm 14,17-19).
A “edificação mútua” é a construção da comunidade cristã, onde Deus se manifesta. A comunidade cristã deve ser a presença do reino de Deus de forma social: o mundo transformado pela vida digna, justiça, paz e alegria no Espírito do Senhor Jesus Cristo crucificado e ressuscitado. Por isso, as outras passagens de Paulo, que enfatizam mais a chegada do reino de Deus no futuro, exigem dos cristãos a “ação concreta” de edificar e transformar a comunidade em pureza e santidade:
E as obras da carne são bem conhecidas: união ilegítima, impureza, libertinagem, idolatria, feitiçaria, inimizades, briga, ciúme, raiva, discussões, discórdias, sectarismos, invejas, bebedeiras, farras e coisas semelhantes a essas. A respeito delas eu já lhes falei, e volto a preveni-los: os que praticam tais coisas não terão como herança o Reino de Deus. O fruto do Espírito é amor, alegria, paz, paciência, bondade, generosidade, fé, humildade e domínio de si mesmo (Gl 5,19-23; cf. 1Cor 6,9-10; 15,50).
De acordo com Paulo, filho do seu tempo, os cristãos devem edificar a comunidade na vida cotidiana. Ela deve ser o sinal da presença do reino de Deus antecipado, no qual o Senhor Jesus reina no lugar do imperador romano. Como a chegada festiva dos reis, imperadores e autoridades importantes às cidades, a vinda final do Senhor deve acontecer, com as saídas festivas dos cristãos ao encontro do verdadeiro Senhor e o retorno com ele ao mundo transformado pela justiça e pela paz. É assim que alguns pesquisadores comentam a vinda do Senhor em 1Ts 4,16:
A metáfora da parúsia como visita estatal dá a entender que os que correm para aplaudir o governador que está chegando voltarão com ele para as alegrias da festa da cidade. Assim também com Cristo. Provavelmente, Paulo subentendia que todos desceriam para habitar a terra purificada. A parúsia do Senhor não tinha nada a ver com a destruição da terra e a consequente transferência para o céu, mas com o mundo no qual a violência e a injustiça seriam transformadas em pureza e santidade (CROSSAN; REED, 2007, p. 160-161).
Paulo, que esperava a vinda final de Cristo para muito breve, não estava pregando a parúsia do Senhor como as destruições cósmicas apocalípticas, mas como as transformações definitivas do mundo pela justiça e pela paz, nas quais as pessoas estariam em comunhão eterna com o Senhor Cristo Jesus e entre si. Os fiéis deveriam ser os promotores desse mundo pela edificação da comunidade cristã: a presença antecipada do reino de Deus.
Na realidade, essa visitação final exorta e fortalece a fé e a esperança, capazes de encorajar os fiéis diante da perseguição e da morte. Ao mesmo tempo, a esperança pela visitação final do Senhor se torna inquietação e angústia: “quando” da chegada. E não será imprevisível. Além disso, Cristo é que chegará para concluir a história humana, presidir o juízo final e estabelecer a salvação final. A inquietação pelo Dia do Senhor aumenta no meio dos cristãos de Tessalônica, e Paulo responde a essa inquietação em 1Ts 5,1-11.
- “Fiquemos sóbrios, revestindo a armadura da fé e do amor, e o capacete da esperança da salvação”
A espera da vinda do Senhor é o tema que perpassa a primeira carta aos Tessalonicenses (1Ts 1,10; 2,19; 4,16; 5,23). Muitos dos que acreditaram no anúncio dos apóstolos morreram; por isso, havia muita inquietação por parte de algumas pessoas da comunidade sobre qual seria o destino delas. É bem provável que os missionários tenham falado sobre a ressurreição dos mortos. No tempo dos apóstolos, a crença positiva a respeito da vida após a morte era uma convicção somente das elites. A mensagem de Paulo e seus colaboradores restabeleceu essa esperança para todas as pessoas.